Teologia

sábado, 16 de março de 2024

QUAL VERSÃO DA BÍBLIA DEVEMOS USAR?

Gerhard Pfandl*

Explore a rica história de como Deus liderou as traduções da Bíblia.

Desde meados do século XX, quando as traduções da Bíblia começaram a se multiplicar, a questão de qual versão da Bíblia os adventistas deveriam usar tornou-se um pomo de discórdia em algumas igrejas. Há aqueles que acreditam que apenas a versão King James (KJV) deveria ser usada, enquanto outros sustentam que uma tradução moderna é preferível por causa da linguagem arcaica da KJV.

O processo de tradução da Bíblia começou durante o século III a.C., com a tradução do Antigo Testamento do hebraico para o grego. Esta tradução, realizada em Alexandria, foi chamada de Septuaginta (LXX), versão1 da década de 70, porque foi assim que muitos tradutores estiveram envolvidos. A tradução feita em Alexandria ajudou a fornecer a Bíblia principalmente para a diáspora judaica, especialmente para os judeus de língua grega que não falavam ou entendiam mais o hebraico.

Embora a LXX tenha sido feita para judeus de língua grega, na era cristã esta tradução logo caiu em desuso entre os judeus, principalmente porque os cristãos emergentes adotaram a LXX como sua versão do Antigo Testamento e a usaram livremente em defesa da fé cristã. “Os cristãos passaram a atribuir algum grau de inspiração divina à Septuaginta, pois algumas de suas traduções podem quase parecer ter sido providencialmente destinadas a apoiar os argumentos cristãos.”2 Os judeus, portanto, logo produziram outras versões gregas.3

VERSÕES CRISTÃS

Depois da LXX, a tradução mais antiga e importante da Bíblia é a versão siríaca chamada Peshitta, ou versão “simples”. O siríaco é um dialeto aramaico falado em uma ampla área nos primeiros tempos cristãos, especialmente na Mesopotâmia ocidental, onde era mais usado que o grego.

Durante o início da era cristã, as igrejas no Oriente falavam principalmente grego; O latim era a língua oficial nas províncias romanas da África e da Europa Ocidental. Perto do final do segundo século, portanto, encontramos referências às Escrituras Latinas nos escritos dos Padres da Igreja. Devido à tendência de alguns bispos e padres de fazer traduções dos manuscritos da Septuaginta e do Novo Testamento para o latim, começaram a aparecer diversas traduções de vários textos bíblicos. Esses fragmentos foram posteriormente reunidos e ficaram conhecidos como texto em latim antigo, também chamado de Itala.

Em 382, ​​o Papa Dâmaso I (366–384) encarregou seu secretário, Jerônimo, de produzir uma nova Bíblia em latim. Jerônimo primeiro revisou os textos em latim antigo e produziu um texto latino padrão do Novo Testamento. Após a morte de Dâmaso, Jerônimo se estabeleceu em Belém, onde completou uma nova tradução latina do Antigo Testamento do hebraico em 405. A Bíblia de Jerônimo ficou conhecida como Vulgata (vulga que significa “discurso cotidiano”). A Bíblia Vulgata foi o primeiro livro a ser impresso por Johannes Gutenberg em 1456. Em 1546, no Concílio de Trento, a Vulgata tornou-se a Bíblia oficial da Igreja Católica.

Versões em Inglês Versões antigas da Bíblia foram de vital importância para levar o evangelho às nações pagãs durante os primeiros séculos do Cristianismo. Da mesma forma, durante a época da Reforma, as traduções para vários idiomas facilitaram a difusão das ideias da Reforma na Europa. Desde então, a Bíblia foi traduzida para muitos idiomas. De acordo com as estatísticas de 2015 dos Tradutores da Bíblia Wycliffe, a Bíblia completa foi traduzida para 554 idiomas, o Novo Testamento para 1.333 idiomas e um ou mais livros da Bíblia para mais 1.054 idiomas. Isto perfaz um total de 2.932 línguas de um total de cerca de 7.000 línguas faladas no mundo.4

A primeira tradução completa para o inglês é creditada a John Wycliffe, professor da Universidade de Oxford, na última parte do século XIV. Wycliffe acreditava que “se todo homem fosse responsável por obedecer à Bíblia... segue-se que todo homem deve saber o que obedecer. Portanto, toda a Bíblia deveria estar acessível a ele numa forma que ele pudesse entender.”5 Não se sabe se o próprio Wycliffe participou da tradução, mas sob sua influência foram produzidas duas versões em inglês da Vulgata Latina. Cento e cinquenta anos depois, William Tyndale, que se tornou proficiente em grego enquanto estudava em Oxford e Cambridge, traduziu o Novo Testamento grego para o inglês. Este foi publicado em 1525 na Alemanha e depois contrabandeado em fardos de tecido de volta à Inglaterra para distribuição. Oficiais da Igreja se opuseram à circulação de sua tradução; eles compraram cópias e as queimaram. O próprio Tyndale, após ser traído por um amigo, foi preso e executado em 1536 na Bélgica. Em 1535, um ano antes da morte de Tyndale, Miles Coverdale publicou outra tradução completa em inglês. Naquela época, Henrique VIII havia se tornado chefe da igreja na Inglaterra e estava pronto para aceitar traduções da Bíblia para o inglês.

Depois que Jaime I se tornou rei da Inglaterra, ele autorizou uma nova tradução, que, desde sua publicação em 1611, é conhecida como Versão Autorizada ou King James (KJV). Mais de 50 estudiosos, versados ​​em grego e hebraico, foram responsáveis ​​pela sua produção. Capturou o melhor de todas as traduções anteriores e superou em muito todas elas. Esta versão foi justificadamente chamada de “monumento mais nobre da prosa inglesa”.6 Com base nas melhores versões anteriores em inglês, a KJV permaneceu “a Bíblia” por excelência onde quer que o inglês fosse falado por mais de trezentos anos.

No entanto, no final do século XIX, os estudiosos sentiram que era necessária uma revisão porque (1) o conhecimento do vocabulário hebraico tinha aumentado desde o início do século XVII (cerca de 1.500 palavras aparecem apenas uma vez no Antigo Testamento); (2) o texto grego subjacente ao Novo Testamento foi o Textus Receptus (ver A controvérsia da KJV, a seguir), que foi baseado em manuscritos medievais tardios; e (3) muitas palavras inglesas tornaram-se obsoletas ou arcaicas; outros mudaram de significado. Por exemplo, a palavra botão em Êxodo 25:31 é uma palavra arcaica para o botão de uma flor ou para um botão ornamental.7 A palavra prevenir (1 Tessalonicenses 4:15) no século XVII significava  “ir adiante” ou “preceder” em vez de “impedir”.

Em 1870, a Convocação de Canterbury votou para patrocinar uma grande revisão da versão King James. Quando a Versão Revisada completa apareceu em 1885, foi recebida com grande entusiasmo, mas sua popularidade durou pouco porque a maioria das pessoas continuou a preferir a Versão Autorizada.

A CONTROVÉRSIA DA KJV

Em 1516, o estudioso holandês Desiderius Erasmus publicou o primeiro Novo Testamento grego em Basileia, Suíça, que se tornou a base do Textus Receptus (latim para "o texto recebido"). Infelizmente, nenhum dos manuscritos gregos disponíveis a Erasmo era anterior ao século X.8 Theodor Beza (1519–1605), um estudioso bíblico e sucessor de João Calvino em Genebra, melhorou e popularizou o texto de Erasmo, que, em 1633, ficou conhecido como Textus Receptus. Preserva uma forma do Novo Testamento encontrada na grande maioria dos manuscritos gregos.

Desde a época de Erasmo, foram descobertos vários manuscritos gregos mais antigos com leituras variantes do Textus Receptus. O mais importante deles são dois manuscritos do século IV: um se chama Codex Vaticanus porque foi encontrado na biblioteca do Vaticano, e o outro se chama Codex Siniaticus porque foi descoberto em 1844 na biblioteca do mosteiro de Santa Catarina, no sopé do Monte Sinai. No século XIX, o número de variantes entre os manuscritos gregos conhecidos do Novo Testamento foi estimado entre 150.000 e 200.000.9 Em 1881, portanto, dois estudiosos ingleses, Brooke F. Westcott e Fenton J. Hort, publicaram O Novo Testamento no Grego Original, que se baseava principalmente nos antigos códices Vaticano e Sinaiticus.

Este Novo Testamento grego é atacado por defensores apenas da KJV porque a maioria das traduções modernas não são mais baseadas no Textus Receptus, mas no texto de Westcott e Hort e em revisões posteriores dos textos gregos. Um dos principais argumentos dos defensores da KJV é que os tradutores da Bíblia King James confiaram no Textus Receptus porque ele foi providencialmente preservado dos erros dos escribas e das mudanças intencionais ao longo dos séculos. Em contraste, alega-se que o texto grego de Westcott e Hort é baseado em manuscritos produzidos durante um período de apostasia na igreja e não providencialmente protegido de mudanças dos escribas. “As traduções baseadas neles não são, portanto, confiáveis.”10 Estas são suposições interessantes que, no entanto, não podem ser provadas. Embora o século IV certamente tenha sido uma época em que falsos ensinos entraram na igreja, não há nenhuma evidência nos manuscritos existentes do Novo Testamento, alguns dos quais vêm dos séculos II e III, de que esses erros doutrinários tenham afetado qualquer um dos manuscritos gregos produzidos durante a época, daquela vez.

Uma das críticas mais frequentes às versões modernas é a suposta omissão de termos ligados à divindade de Jesus. Por exemplo, onde a KJV repetidamente tem a frase “Senhor Jesus Cristo” (Atos 15:11; 16:31; 1 Coríntios 5:4; 2 Coríntios 11:31, etc.), as versões modernas leem apenas “Senhor Jesus”. A omissão da palavra Cristo nestes textos é vista como uma negação da divindade de Jesus. Gail Riplinger, uma das principais defensoras dos defensores somente da KJV, escreve: “Texe Marrs adverte: 'Os líderes da Nova Era acreditam e espalharão a apostasia de que Jesus não é Cristo nem Deus.' Os editores da nova versão tornam-se 'líderes da Nova Era por esta definição.'”11 Ela ignora completamente o fato de que a frase “Senhor Jesus Cristo”, que aparece cerca de 80 vezes na KJV, também aparece 63 vezes na Revised Standard Version (RSV), e 60 vezes na Nova Versão Internacional (NVI). Embora o Textus Receptus use esta frase mais de 80 vezes, os manuscritos gregos mais antigos a usam apenas cerca de 60 vezes, mas isso não significa que eles de alguma forma neguem que Jesus era o Cristo.

 

Há vários lugares onde as versões modernas são mais fortes e claras sobre a divindade de Jesus do que a KJV. Um exemplo é João 1:18. A KJV diz: “Nenhum homem jamais viu a Deus; o Filho unigênito, que está no seio do Pai, ele o declarou”. Versões modernas, como a New American Standard Bible (NASB), leem “Deus unigênito” e a Nova Versão Internacional (NVI), “mas Deus, o Filho unigênito”, em vez de “Filho unigênito”.

Duas longas passagens não são encontradas nos manuscritos mais antigos. Um são os versículos finais de Marcos (16:9-20) e o outro é a história da mulher apanhada em adultério (João 7:53–8:11). A maioria das versões modernas inclui essas passagens, mas indicam suas omissões nos manuscritos antigos de várias maneiras. Por exemplo, a NVI tem uma linha preta em negrito após Marcos 16:8 com uma nota: “Os dois manuscritos antigos mais confiáveis ​​não contêm Marcos 16:9–20”. Por não termos os autógrafos originais, não sabemos se essas histórias se perderam no processo de transmissão ou se foram acréscimos posteriores de relatos orais. Seja qual for o caso, a sua omissão nos textos antigos não justifica a acusação de que as versões modernas mudaram a Palavra de Deus.

VERSÕES MODERNAS

A proliferação de novas versões em inglês nas últimas décadas tornou necessário considerar cuidadosamente qual tradução será utilizada e para qual finalidade. Primeiro, precisamos reconhecer que existem três tipos básicos de traduções: (1) A tradução formal ou literal tenta traduzir o mais próximo possível do texto original, por exemplo, a versão King James (1611), a Nova King James Versão (NKJV 1982), a Versão Padrão Revisada (RSV 1952) e a New American Standard Bible (NASB 1971, 1995). (2) A tradução de equivalência dinâmica não se preocupa tanto com o texto original, mas com o significado original, por exemplo, a Nova Bíblia Inglesa (NEB 1970), a Nova Versão Internacional (NIV 1978) e a Bíblia Inglesa Revisada (REB 1989). (3) A paráfrase da Bíblia procura reafirmar de forma simplificada, mas compreensível, as ideias transmitidas na língua original, por exemplo, e The Living Bible (1971), The Message (1993), The Clear Word (2000). Paráfrases são mais como comentários. Por exemplo, a KJV traduz Colossenses 2:9 como: “Porque nele habita corporalmente toda a plenitude da Divindade”. Mas The Message Bible fornece uma versão expandida do mesmo versículo: “Tudo de Deus é expresso nele, para que você possa vê-lo e ouvi-lo claramente. Você não precisa de um telescópio, um microscópio ou um horóscopo para perceber a plenitude de Cristo e o vazio do universo sem ele.”

Então, qual versão devemos usar? Para estudo sério da Bíblia e pregação, é útil consultar diversas versões boas. Boas traduções padrão modernas são a RSV, a NASB e a NKJV. Para devoções pessoais e familiares, uma paráfrase pode ser usada. Paráfrases, entretanto, não devem ser usadas na Escola Sabatina ou no púlpito.

ELLEN WHITE E VERSÕES DA BÍBLIA

Ellen White usou profusamente as Escrituras. Todos os seus artigos e livros estão saturados de citações bíblicas da KJV. Ela usou outras versões? Sim, mas com moderação. Entre as versões modernas que Ellen White usou ocasionalmente estavam a Versão Revisada em Inglês (1885) e a Versão Revisada Americana (1901).12

Ellen White não hesitou em usar outras versões, mas preferiu a KJV. No entanto, ela nunca fez do uso da KJV um critério de ortodoxia. Ela estava ciente do fato de que copistas e tradutores, ao longo dos séculos, introduziram algumas mudanças no texto; no entanto, ela poderia dizer: “Aceito a Bíblia tal como ela é, como a Palavra Inspirada”,13 e nós também deveríamos fazê-lo.

*Gerhard Pfandl, PhD, agora aposentado, atuou como diretor associado do Biblical Research Institute, Silver Spring, Maryland, Estados

 

1. A palavra Septuaginta vem do latim para “setenta” (abr. LXX); uma referência aos setenta e dois anciãos judeus que, segundo um relato lendário, fizeram a tradução.

2. FF Bruce, Os Livros e os Pergaminhos, rev. Ed. (Londres: Marshall Pickering, 1991), 141. Em Isaías 7:14, por exemplo, a LXX usa parthenos (virgem) em vez de neanis (jovem mulher), que geralmente é usada para traduzir a palavra hebraica almah.

3. Por exemplo, as versões de Áquila e Teodócio, entre outras.

4. Ver “Scripture and Language Statistics 2015”, Wycliffe Global Alliance, 1 de outubro de 2015, http://www.wycliffe.net/en/statistics.

5. FF Bruce, A Bíblia Inglesa (Oxford: University Press, 1961), 13.

6. JH Skilton, “Versões Inglesas da Bíblia”, no Novo Dicionário Bíblico, ed. JD Douglas (Leicester, Inglaterra: Inter-Varsity Press, 1962), 333.

 

7. R. Bridges e L. Weigle, The King James Word Book (Nashville, TN: Thomas Nelson Publishers, 1994), 196.

8. Bruce M. Metzger, O Texto do Novo Testamento, 2ª ed. (Oxford: Clarendon Press, 1968), 102.

9. Contudo, nenhuma destas variantes de leitura afecta qualquer dos ensinamentos da Bíblia.

10. S. Thompson, “O Grande Debate das Versões da Bíblia”, Record, 22 de julho de 1995, p.

11. GA Riplinger, Versões da Bíblia da Nova Era (Munroe Falls, OH: AV Publications, 1993), 313.

12. Michael W. Campbell, “Ellen G. White e a Versão King James”, em O Livro que Mudou o Mundo, ed. Nikolaus Satelmajer (Nampa, ID: Pacific Press, 2012), 122.

13. Ellen G. White, Mensagens Escolhidas, vol. 1 (Washington, DC: Review and Herald Pub. Assn., 1958), 17.

 

FONTE: Ministry Magazine, junho 20216

 

quinta-feira, 14 de março de 2024

HOMOSSEXUALIDADE: A REFLEXÃO DE UM PASTOR


 Bruce Manners*

O autor sugere algumas maneiras pelas quais os pastores e as igrejas podem prestar cuidado pastoral aos gays e às suas famílias.

A homossexualidade é um tema ao mesmo tempo divisivo e estranho. Quando alguém “sai do armário”, há uma inclinação natural de querer mantê-lo, e ao assunto, no armário. No entanto, se levarmos a sério o ministério, isso incluirá ministrar a pessoas homossexuais dentro e fora da igreja – mas especialmente dentro dela. E isso deve incluir o ministério às famílias muitas vezes esquecidas dos homossexuais.

Como cristãos evangélicos, levamos a Bíblia a sério. Queremos interpretá-lo literalmente sempre que possível – como está escrito em nossas diversas traduções. Lida desta forma, a Bíblia parece condenar a homossexualidade. É claro que alguns argumentam que existem interpretações alternativas dos textos bíblicos, e entre elas indivíduos cuja erudição eu respeito. No entanto, não estou convencido pelos seus argumentos.

Mas a posição que você assume sobre os textos realmente não importa quando a maioria das pessoas em nossas igrejas toma os textos bíblicos como os encontram, o que significa que a atitude predominante é a condenação. Como então nós, como pastores e igrejas, prestamos cuidado pastoral aos gays e às suas famílias?

TRÊS EXPERIÊNCIAS DE APRENDIZAGEM

Há mais de 20 anos, aprendi em primeira mão, e pela primeira vez, algo sobre a dor que os adventistas gays sofrem. Como então editor do Registro da Divisão do Pacífico Sul, publicamos um extenso artigo sobre homossexualidade. Este foi um artigo significativo e equilibrado que apareceu pela primeira vez na revista Insight.2

Fiquei surpreso ao receber diversas respostas de gays adventistas e descobri um pouco da dor que eles sentiam. Eles me contataram para contar sua história e suas lutas. Um deles era um pastor que se perguntava se poderia continuar no ministério com esse fardo.3 Meu contato com eles durou apenas um breve período, mas ainda sinto a tristeza que eles sentiam em suas vidas.

Cerca de cinco anos atrás, como pastor da Avondale College Church, minha equipe pastoral e eu prometemos à nossa congregação que pregaríamos sobre os dez principais tópicos que eles sugerissem. A homossexualidade era uma delas. Tive dificuldade em abordar o assunto, mas decidi pregar sobre como nós, como igreja, deveríamos responder aos gays. Essa parecia uma questão mais premente do que entrar em assuntos como o debate criação-natureza ou revisar novamente os textos bíblicos. Além disso, pregar para agir é sempre melhor do que pregar para dar informação.

Também decidi que conversaria com alguns gays e suas famílias para ter uma ideia real do que estava acontecendo. Quase todos os gays adventistas que encontrei haviam desistido da igreja, e a maioria suspeitava das minhas intenções. Apenas um casal falaria comigo. Eles sentiram que sua igreja os havia rejeitado. Eles estavam sofrendo, e suas famílias também.

Há dois anos (em outra igreja), descobri que tínhamos seis mães de crianças gays em minha igreja, com cerca de 250 participantes. Cada um deles pensava que eram os únicos vivendo com esta situação. Com minha experiência na Igreja do Avondale College, descobri que as mães, mais do que os pais, queriam falar sobre sua experiência, por isso convidei-as para casa num sábado à tarde para se conhecerem. Qualquer um deles poderia desistir no último minuto sem que os outros soubessem quem eram. Nenhum deles sabia quem mais estaria lá até chegarem.

Houve um momento fascinante de surpresa e reconhecimento quando eles se conheceram. Cada um contou sua história.

Houve dor, mas também simpatia e compreensão. Houve lágrimas, mas pela primeira vez outras pessoas na mesma situação choraram com elas.

CONTANDO A DOR

A dor e a confusão de indivíduos que lutam com a sua identidade sexual estão bem documentadas, mas tornam-se reais quando você encontra a dor e a confusão de perto. Vários gays me contaram sobre pensamentos suicidas enquanto lutavam contra os sentimentos que tinham ao aceitar sua orientação e o fato de que não conseguiam encontrar uma maneira de se livrar dela.

Conversei com um ex-aluno do Avondale College que foi uma das pessoas mais ativas e envolvidas durante meu tempo no campus. Ele tinha paixão e entusiasmo pelo cristianismo e pelo adventismo, e seu testemunho era forte. Ele frequentemente aparecia liderando programas devocionais, mas ninguém sabia que ele estava desmoronando por dentro enquanto lutava contra sua homossexualidade.

Suas orações desesperadas por libertação não foram atendidas e sua vida estava se tornando mais confusa e caótica. Ele não apenas pensou em suicídio, mas também preparou seu dormitório para o ato. Ele estava prestes a colocar seu plano em ação quando um colega bateu à sua porta. Ambos ainda sentem que Deus organizou a visita naquele momento, naquele dia – o outro estudante não planejou passar por aqui até “solicitado por Deus”. Isso salvou a vida desse homem gay.

Um casal voltou para casa depois da igreja num sábado e descobriu que seu filho, no final da adolescência, havia rasgado sua Bíblia em pequenos pedaços e os espalhado por todos os cômodos da casa. Ele também estava angustiado com Deus para eliminar suas tendências gays.

Quando seus pais perguntaram por que ele fez isso, ele respondeu: “Se Deus não me ouve, por que eu deveria ouvi-Lo?”

Quando conversei com outro casal sobre sua filha gay, houve um momento em que houve uma pausa e então, naquele silêncio, a mãe disse: “Gostaria que ela nunca tivesse nascido”.

A dor e o trauma são reais. Aqui temos vidas em risco, vidas necessitadas de amor. Precisando de compaixão.

UM EXEMPLO DE JESUS?

Sabemos que Jesus tinha um coração voltado para as pessoas e tinha como alvo aqueles que tinham problemas profundos em suas vidas, incluindo possessão demoníaca. Infelizmente, não existe nenhum registro dele ministrando aos gays que possa servir de modelo. Contudo, Sua interação com a mulher samaritana junto ao poço fornece um guia útil.

A primeira coisa a notar neste encontro são as diferenças religiosas. Como samaritana, a mulher usou uma “Bíblia” diferente da que Jesus usou (apenas os cinco livros de Moisés). Ela sacrificou em um templo diferente (no Monte Gerizim, não no Monte Sião). E ela esperou por um messias diferente daquele que estava diante dela (alguém como Moisés, não da linhagem de Davi).

Tudo isso foi instrutivo por si só, mas o que importa? Ela teve uma vida complicada. Ela teve cinco maridos. E ela estava atualmente, como costumávamos dizer, “vivendo em pecado”.

Jesus demonstrou respeito por ela. Muito mais respeito do que ela poderia esperar de qualquer outro judeu, e provavelmente mais do que ela tinha de outros samaritanos. Ele demonstrou cuidado, preocupação e compaixão.

Jesus veio para resgatar as pessoas, não para condená-las (ver João 3:17). Ele reservou Suas críticas sérias aos hipócritas religiosos (ver, por exemplo, Mateus 23). Ele deu o exemplo.

O QUE PODEMOS FAZER?

Precisamos estar cientes da probabilidade de termos pessoas gays ou, ainda mais provável, membros da família de uma pessoa gay na nossa congregação. Você nunca será capaz de ministrar a eles em um nível profundo se mantiver uma atitude negativa ou usar linguagem dura contra os gays ou a homossexualidade. Eles vão pensar que você não entende a dor e não pode confiar na dor deles.

Pergunte a si mesmo se deseja que sua congregação seja um apoio para indivíduos que estão lutando com sua identidade sexual e com suas famílias. Existem outras pessoas que os gays encontrarão, que irão ouvi-los e conversar com eles. Um pastor amigo meu certa vez esclareceu isso ao dizer: “O que estamos perguntando é: queremos eles em nossa igreja ou nos bares gays?”

Estas são discussões que você deve ter com os principais atores da sua igreja, especialmente os presbíteros e líderes ministeriais. Se eles não estiverem a bordo, podem causar-lhe sofrimento.

Nós, pastores, precisamos ter ouvidos solidários quando uma pessoa gay se revela para nós. Eles não acham fácil fazer isso e isso demonstra muita confiança da parte deles. A confidencialidade é importante. Se forem suicidas, isso deve ser resolvido imediatamente. A taxa de suicídio entre jovens gays é estimada em quatro vezes maior do que entre os heterossexuais e nove vezes maior se suas famílias os rejeitarem.4 Mantê-los vivos é uma prioridade.

Conectar mães (ou pais) é realmente útil para elas. Eles não se sentem mais sozinhos com a sensação de que são os únicos que estão passando por isso. Porém, descobrir quem eles são não é fácil. Não force, no entanto. Alguns precisam de tempo para estarem prontos para algo assim.

Quando chegar o momento certo, pode ser útil que os pais conversem com grupos religiosos selecionados sobre a sua experiência. Até que a igreja compreenda as realidades e os traumas que acontecem na família e com o indivíduo gay, eles não saberão que é necessário apoio. Torna-se real quando um deles compartilha sua experiência. Eles receberão uma audiência simpática. Sugiro os pais, porque pode ser muito confrontador para o gay ou para os membros da igreja – e pode levar a um resultado negativo. Incentive os amigos a continuarem a amizade com aquele que se declarou gay. Ele ou ela precisará deles e de seu apoio.

Alguns podem sentir que estão a baixar os seus “padrões” ou a ignorar uma injunção bíblica se estenderem a mão. Não tão. Seremos conhecidos como discípulos de Jesus à medida que demonstramos amor uns pelos outros (ver João 13:35) – incluindo os nossos gays.

A igreja em geral tem e precisa ter políticas sobre muitas questões, incluindo a homossexualidade. Estas políticas proporcionam uma abordagem global. Contudo, é na igreja local que a aplicação de carne e sangue é realizada. É aqui que surge o desafio de aplicá-los de uma forma amorosa e atenciosa que demonstre semelhança com Cristo.

UMA RESPOSTA PASTORAL E ECLESIAL

Sou pastor, não um especialista nesta área, e o meu envolvimento neste tipo de ministério tem sido limitado e esporádico. Porém, como pastor, quando alguém do meu povo sofre, quero estar ao lado dele. Essa é uma das responsabilidades que Deus nos deu.

Lembro-me de ter ouvido falar de um pastor aposentado, mais velho, que estava em uma recepção de casamento quando alguém apontou para uma jovem do outro lado do salão que havia sido membro de uma de suas congregações. Ela estava lutando depois de recentemente se declarar gay. Ao ouvir isso, ele imediatamente atravessou o corredor e a abraçou. Não sei o que ele disse, mas o abraço sinalizou que ela era amada.

Eu quero ser esse tipo de pastor.

Tenho orgulho de um casal em uma de minhas igrejas que descobriu outro casal passando por dificuldades depois que seu filho se declarou gay. Sem saber o que mais fazer, eles convidaram o casal e o filho para almoçar em casa no sábado — todos os sábados por mais de um ano. Isso deu a esses pais a oportunidade de conversar, desabafar e, ocasionalmente, chorar com alguém que se importava.

Quero minha igreja cheia desse tipo de pessoa.

Darei a última palavra às mães. Muitos deles me disseram algo como:

Eu sei o que a Bíblia diz, mas ainda amo meu filho ou filha. Então eles deveriam.

 

E nós também deveríamos. Sabendo o que a Bíblia diz, devemos também amar os seus filhos e filhas. Esse é o cristianismo fundamental. É aí que começa a compaixão de Cristo.

Barra lateral: lições aprendidas ao longo do caminho

·         O argumento da natureza ou da criação (nascida com ou aprendida) das origens da homossexualidade – e qualquer uma das outras numerosas teorias – pode proporcionar uma boa discussão e debate intelectual, mas na verdade tem pouco valor quando um indivíduo está a lutar com a sua identidade sexual. Eles realmente não se importam com as origens; eles simplesmente querem que isso desapareça.1

·         Os gays muitas vezes dirão que foi assim que Deus os criou. Nenhum argumento mudará isso. Para eles, a afirmação “Deus ama o pecador, mas não o pecado” é bastante ofensiva porque você está dizendo que Deus cometeu um erro quando os criou.2

·         O celibato é tão difícil para os gays quanto para os heterossexuais.

·         Somos mais duros com os delitos gays do que com os heterossexuais.

·         Os pais adventistas esperam, contra toda esperança, que seu filho gay possa continuar conectado à igreja de alguma forma. Poucos o fazem.

·         É incrivelmente difícil para a maioria das pessoas mudar a sua orientação gay. Isto não subestima o poder de Deus, mas é um aviso de que Deus nem sempre intervém para tirar esta cruz. As desculpas públicas aos homossexuais do conhecido “ministério da mudança” deveriam ser um aviso de que a mudança não é fácil.3

·         Ocasionalmente há aqueles que afirmam vitória sobre a sua homossexualidade. Alegremo-nos com eles e rezemos pelo seu sucesso contínuo; mas também não esperemos que a sua história seja a história de todos.

·         Os gays se sentem alienados da igreja. Para muitos, o conflito parece avassalador e têm a sensação de que as opiniões oficiais da Igreja não os deixam sem ter para onde ir.

·         A maioria dos gays não faz grandes exigências à sua igreja quando se assumem. Tendem a compreender as dificuldades que a sua situação coloca à igreja. Mas eles gostariam de saber que são bem-vindos. Eles querem que as amizades continuem.

1. Eu estava conversando com a mãe do menino que destruiu a Bíblia sobre o debate natureza-criação quando ela me interrompeu e disse: “O que isso importa? Este é quem ele é.

2 Micah J. Murray, um cristão, diz desta forma: “Não posso mais olhar nos olhos do meu irmão gay e dizer: 'Eu amo o pecador, mas odeio o pecado' porque isso o rotula de 'Pecador'.” Veja “Por que não posso mais dizer 'Ame o pecador/Odeie o pecado'”, Huff Post Religion, The Blog, 31 de dezembro de 2013, huffingtonpost. com/micah-j-murray/why-i-cant-say-love-the-sinner-hate-the-sin-anymore_b_4521519.html.

3. Alan Chambers, o presidente da Exodus International, fez um pedido público de desculpas aos gays que incluía: “Lamento a dor e a mágoa que muitos de vocês experimentaram. Lamento que alguns de vocês tenham passado anos lidando com a vergonha e a culpa quando suas atrações não mudaram.” “Exodus Int'l President to the Gay Community: 'We're Sorry'”, Alan Chambers, 19 de junho de 2013, alanchambers.org/exodus-intl-president-to-the-gay-community-were-sorry . Robert L. Spitzer escreveu uma carta de desculpas publicada no Archives of Sexual Behavior  , onde os resultados de sua pesquisa foram publicados em 2003: “Acredito que devo à comunidade gay um pedido de desculpas por meu estudo, fazendo afirmações não comprovadas sobre a eficácia da terapia reparativa.” (http://www.truthwinsout.org/news/2012/04/24542/).

·         O argumento da natureza ou da criação (nascida com ou aprendida) sobre as origens da homossexualidade – e qualquer uma das outras numerosas teorias – pode contribuir para uma boa discussão e debate intelectual, mas na verdade tem pouco valor quando um indivíduo está a lutar com a sua identidade sexual. Eles realmente não se importam com as origens; eles simplesmente querem que isso desapareça.1

·         Os gays muitas vezes dirão que foi assim que Deus os criou. Nenhum argumento mudará isso. Para eles, a afirmação “Deus ama o pecador, mas não o pecado” é bastante ofensiva porque você está dizendo que Deus cometeu um erro quando os criou.2

·         O celibato é tão difícil para os gays quanto para os heterossexuais.

·         Somos mais duros com os delitos gays do que com os heterossexuais.

·         Os pais adventistas esperam, contra toda esperança, que seu filho gay possa continuar conectado à igreja de alguma forma. Poucos o fazem.

·         É incrivelmente difícil para a maioria das pessoas mudar a sua orientação gay. Isto não subestima o poder de Deus, mas é um aviso de que Deus nem sempre intervém para tirar esta cruz. As desculpas públicas aos homossexuais do conhecido “ministério da mudança” deveriam ser um aviso de que a mudança não é fácil.3

·         Ocasionalmente há aqueles que afirmam vitória sobre a sua homossexualidade. Alegremo-nos com eles e rezemos pelo seu sucesso contínuo; mas também não esperemos que a sua história seja a história de todos.

·         Os gays se sentem alienados da igreja. Para muitos, o conflito parece avassalador e têm a sensação de que as opiniões oficiais da Igreja não os deixam sem ter para onde ir.

·         A maioria dos gays não faz grandes exigências à sua igreja quando se assumem. Tendem a compreender as dificuldades que a sua situação coloca à igreja. Mas eles gostariam de saber que são bem-vindos. Eles querem que as amizades continuem.

1. Eu estava conversando com a mãe do menino que destruiu a Bíblia sobre o debate natureza-criação quando ela me interrompeu e disse: “O que isso importa? Este é quem ele é.

2 Micah J. Murray, um cristão, diz desta forma: “Não posso mais olhar nos olhos do meu irmão gay e dizer: 'Eu amo o pecador, mas odeio o pecado' porque isso o rotula de 'Pecador'. ” Veja “Por que não posso mais dizer 'Ame o pecador/Odeie o pecado'”, Huff Post Religion, The Blog, 31 de dezembro de 2013,  huffingtonpost. com/micah-j-murray/why-i-cant-say-love-the-sinner-hate-the-sin-anymore_b_4521519.html.

3 Alan Chambers, o presidente da Exodus International, fez um pedido público de desculpas aos gays que incluía: “Lamento a dor e a mágoa que muitos de vocês experimentaram. Lamento que alguns de vocês tenham passado anos lidando com a vergonha e a culpa quando suas atrações não mudaram.” “Exodus Int'l President to the Gay Community: 'We're Sorry'”, Alan Chambers, 19 de junho de 2013,  alanchambers.org/exodus-intl-president-to-the-gay-community-were-sorry . Robert L. Spitzer escreveu uma carta de desculpas publicada no  Archives of Sexual Behavior  , onde os resultados de sua pesquisa foram publicados em 2003: “Acredito que devo à comunidade gay um pedido de desculpas por meu estudo, fazendo afirmações não comprovadas sobre a eficácia da terapia reparativa.” (http://www.truthwinsout.org/news/2012/04/24542/).

*Bruce Manners, PhD , é um pastor recentemente aposentado que reside em Melbourne, Austrália.

 

FONTE: Ministry Magazine, janeiro de 2016

domingo, 10 de março de 2024

EXISTE ALGUMA COISA DO OUTRO LADO DA MORTE?

Ricardo André

A grande certeza da vida, desde que nascemos, é que um dia morreremos. Desde nosso primeiro instante de vida, entramos em uma contagem regressiva que marcará nossos dias de vida terrestre. A cada instante estamos mais próximos deste momento tão “misterioso” e temido por muitos. Neste exato momento, muitos estão dando seu último suspiro. Indubitavelmente, a morte é uma triste experiência pela qual a humanidade passa. Ela nos tem tomado pais, filhos e amigos. O apóstolo Paulo a chama de inimiga (1 Co 15:26). A morte é o dilema que faz parte da vida de todo ser humano após a entrada do pecado. As Sagradas Escrituras revelam que fomos criados para viver eternamente, mas ela entrou no mundo como consequência do pecado cometido pelo homem. Portanto ela é uma intrusa. A morte é o salário do pecado (Gn 2:17; Rm 6:23) e conflita com o desejo humano de permanência. Como afirmou S. Júlio Schwantes: “A transitoriedade das glórias terrestres e a vã esperança de permanência acalentada em todo coração, constituem melancólico contraste. A inevitabilidade da morte lança um véu sombrio sobre os sonhos mais dourados” (O Despontar de uma Nova Era, p. 269).

Quando perdemos um ente querido para a morte, esta produz um vazio e uma sensação de carência difíceis de serem igualados. Ela é a maior frustração humana que nos leva a perguntar: A morte é o fim de tudo? O que será de nós? Poderemos reencontrar nossos queridos que morreram? E, para essa realidade, é importante olhar para a Palavra de Deus e perceber o que ela ensina. Antes, porém, nos parece útil observarmos o que pensavam os filósofos do passado a respeito do tema.

O pensamento materialista e a morte

Importantes filósofos do século XIX adotaram a perspectiva secular-humanista e apegaram-se fortemente à ideia de que a morte é o fim. Não existe nada mais. Para esses filósofos materialistas ateus, não existe nada além da matéria e da energia. Portanto, eles negam a realidade do sobrenatural e da existência de Deus. Eles não conseguem ver um sentido para a vida e para a morte. Eles encaram a vida de maneira trágica, como algo sem sentido. Martin Heidegger (1889-1976), filósofo existencialista alemão, dizia: “A morte é um modo de ser que a existência humana assume, desde que ela tem início”. Por isso os existencialistas definem o homem como um “ser-para-a-morte”, não só porque está destinado a morrer, mas porque é constantemente atingido pela realidade da morte.

Os existencialistas afirmam que a vida humana é limitada por dois nada: o homem teria surgido do nada, não como resultado de uma criação especial por um Deus amoroso, e se dirige lenta e inexoravelmente para outro nada. E o que dá uma nota trágica à existência – para os existencialistas ateus – é que a pessoa tem consciência de estar caminhando para a destruição; isto é terrível. Então, nasce dentro do homem a angústia de que Heidegger falava ou a náusea de Jean Paul Sartre. Nesta mesma linha outros filósofos fizeram muito mal à humanidade, especialmente aos jovens, pois deram à vida uma conotação sombria, sem a esperança da fé cristã.

O famoso filósofo alemão Friedrich Nietzsche (1844-1900), que estava determinado a ver Deus morto e sepultado, é uma outra figura típica desta atitude irreligiosa. Foi o filósofo mais satírico em relação a Deus e ao sistema de valores cristãos. Vários de seus textos critica duramente a religião. Ele é amplamente conhecido por sua filosofia niilista e por sua ideia de que “Deus está morto”. Ele despertou para a filosofia através de Schopenhauer. Ele disse que: “Schopenhauer foi, como filósofo, o primeiro ateísta confesso e inflexível que nós alemães tivemos”. Como quase todos os ateus depois de Feuerbach, Nietzsche também considera a religiosidade como uma inconsciente projeção.

Com base na perspectiva de Nietzsche, a vida não tem nenhum significado, propósito ou valor intrínseco. Que quadro desolador!

Para o grande filósofo alemão Karl Marx (1818-1883), cujas ideias revolucionaram o pensamento filosófico, rompendo barreiras e desvelando a forma de organização de nossa sociedade, Deus e a religião não passavam de meras projeções humanas. Afirmou que a religião havia sido inventada como uma forma de reagir contra o sofrimento e a injustiça do mundo, os pobres e oprimidos tinham criado a religião para imaginar que teriam uma vida melhor após a morte. Servindo como uma forma de “ópio”, uma maneira de escapar da realidade. Portanto, para ele, o ateísmo é um postulado evidente. Tanto é assim que ele escreveu: “A miséria religiosa constitui ao mesmo tempo a expressão da miséria real e o protesto contra a miséria real. A religião é o suspiro da criatura oprimida, o ânimo de um mundo sem coração, assim como o espírito de estados de coisas embrutecidos. Ela é o ópio do povo.” (“Crítica da Filosofia do Direito de Hegel”, ed. Boitempo, p. 145). Ele ainda vislumbrava a possibilidade do desaparecimento do sentimento religioso com a eliminação da alienação, numa sociedade despojada da exploração do homem pelo homem e livre do trabalho alienado.

Richard Dawkins, considerado ícone do ateísmo atual, autor de Deus: Um Delírio, pretende “esclarecer” que Deus não passa de invenção de pessoas desiludidas. Ele afirma categoricamente a intenção de seu livro: “Os leitores religiosos que o abrirem serão ateus quando o tiverem terminado”.

Portanto, Deus, para estes ateus não é senão uma ilusão criada pelo homem buscando uma compensação diante de sua miséria; o que o faz fugir do mundo e das grandes tarefas humanas. Se Deus não existe, então para esses filósofos a morte é o fim. Não existe nada mais. A escritora cristão Ellen G. White afirma que a humanidade fracassará em todas as suas tentativas de progresso se “negligenciar a única Fonte de esperança” (Caminho a Cristo, p. 20).

Para além do “ópio” de Marx, nossa religação com Deus é a chave para o mistério dos mistérios, o significado da vida. Deus é o Criador da vida, por isso é Ele que dá sentido à vida. Deus nos criou para Seu louvor (Is 43:20-21). Ele nos formou de maneira especial, para mostrar Sua glória e Seu amor através de nós. Esse é o grande sentido da vida. A satisfação plena é produto da segurança absoluta e da paz interior que só Deus pode dar. Só um Deus infinito pode preencher, com o Seu amor, o espaço infinito do coração humano. E esta conquista espiritual está ao alcance de todos os que, reconhecendo a sua insuficiência, aceitam o presente que o Céu oferece – a vida eterna, através de Jesus Cristo: “Porque o salário do pecado é a morte, mas o dom gratuito de Deus é a vida eterna em Cristo Jesus, nosso Senhor” (Rm 6:23).

Vê-se, como bem observou Francis D. Nichol, “nas profundezas da alma humana se acha implantada a inquietação pelo futuro. Essa percepção do infinito no tempo e no espaço produz insatisfação com a natureza transitória das coisas desta vida. É o plano de Deus que o homem perceba que o atual mundo material não constitui o centro de sua existência. Ele se acha ligado a dois mundos: fisicamente a este mundo, mas mental, emocional e psicologicamente ao mundo eterno” (Comentário Bíblico Adventista do Sétimo Dia, v. 3, 1075).

Qual o resultado da influência desses filósofos sobre as pessoas da atualidade? Associado com diversos fatores, a contínua campanha de descrédito à fé tem contribuído fortemente para sedimentar o espírito de desesperança no coração de muitos, e isso leva as pessoas a perderem a paz e a alegria, e leva também muitos a tomar atitudes extremas contra a própria vida.

Milhões de pessoas sem esperança. Esse é o fruto das ideias materialistas ateístas. “O que é uma pessoa sem esperança? É alguém sem sonhos, sem ideais, sem futuro... É alguém sem otimismo, que não sente vontade de lutar. Quando não há esperança, o desespero ocupa seu lugar. O pensamento derrotista se apodera da pessoa e sobrevém o fracasso” (Enrique Chaij, Ainda Existe Esperança: A solução para os problemas da vida [CPB, 2010], p. 8).

Há esperança para os mortos

A glória da fé cristã é que Jesus responde às perguntas universais: Existe alguma coisa do outro lado da morte? Encontrar-nos-emos de novo? Como cristãos, temos a promessa gloriosa: “Felizes os mortos que morrem no Senhor de agora em diante". Diz o Espírito: "Sim, eles descansarão das suas fadigas, pois as suas obras os seguirão" (Ap 14:13, NVI). Quem são esses mortos que “morrem no Senhor”? “São os que morreram com a fé fixa em Jesus” (Comentário Bíblico Adventista do Sétimo Dia, v. 7, p. 924).

Neste texto sacro somos lembrados de uma verdade profunda e reconfortante: os mortos que morreram em Cristo são felizes. Esse pensamento bíblico da morte, soa como um paradoxo. Parece estranho considerar "felizes" aqueles que morrem. Porém, quando analisamos o que a Bíblia diz sobre este assunto chegamos a uma conclusão diferente. Por que são felizes os que “morrem no Senhor”? Porque os que têm fé em Jesus ao morrer têm um brilhante futuro ao qual aguardar. Eles são "felizes" por causa da recompensa que receberão. Sobre isso, Ellen G. White escreveu: “Nossos corpos mortais podem morrer e ser colocados na sepultura. No entanto, a bendita esperança vive até a ressurreição, quando a voz de Jesus invoca os que dormem reduzidos ao pó da terra. Desfrutaremos então da plenitude da bendita e gloriosa esperança. Sabemos em quem nós cremos. Não corremos nem trabalhamos em vão. Um rica e gloriosa recompensa está diante de nós; é o prêmio pelo qual corremos e, se perseverarmos com coragem, certamente o obteremos” (As Três Mensagens Angélicas [CPB, 2023], p. 131).

Sobre isso, a nota de rodapé da Bíblia King James afirma: “Os cristãos [os santos] que perseveram em obedecer aos mandamentos de Deus e permanecem fiéis a Jesus serão abençoados com a recompensa de suas obras piedosas” (BKJ Fiel 1611, p. 2021).

Portanto, a fé cristã se projeta desta vida para a eternidade. Isso porque Jesus venceu a morte, deixando a tumba vazia (Mt 28:5-7; 1 Co 15:3-8). A mensagem Dele para nós é: Ainda não acabou. Confie em Mim. “Eu sou a ressurreição, e a vida; quem crê em mim, ainda que esteja morto, ele viverá.” (Jo 11:25, BKJ 1611).

O apóstolo cristão Paulo, em sua inspirada carta escrita aos tessalonicenses, traz uma outra palavra de encorajamento e de fé aos que creem em Jesus. Diz-nos o apóstolo: “Irmãos, não queremos que vocês sejam ignorantes quanto aos que dormem, para que não se entristeçam como os outros que não têm esperança. Se cremos que Jesus morreu e ressurgiu, cremos também que Deus trará, mediante Jesus e juntamente com ele, aqueles que nele dormiram. Dizemos a vocês, pela palavra do Senhor, que nós, os que estivermos vivos, os que ficarmos até a vinda do Senhor, certamente não precederemos os que dormem. Pois, dada a ordem, com a voz do arcanjo e o ressoar da trombeta de Deus, o próprio Senhor descerá do céu, e os mortos em Cristo ressuscitarão primeiro. Depois disso, os que estivermos vivos seremos arrebatados juntamente com eles nas nuvens, para o encontro com o Senhor nos ares. E assim estaremos com o Senhor para sempre. Consolem-se uns aos outros com estas palavras. (1 Ts 4:13-18, NVI).

Os Tessalonicenses haviam recebido o Evangelho há bem pouco tempo. Após esta experiência maravilhosa, alguns de seus parentes e amigos "dormiram no Senhor"...  Como esperavam permanecer vivos até o retorno do Senhor, e alguns "dormiram em Jesus", eles estavam extremamente perplexos. A fim de neutralizar esta tendência ao aborrecimento e tristeza imoderados, o apóstolo, os consola com a agradável esperança de uma reunião feliz e eterna com aqueles que morreram quando o Senhor Jesus aparecer em glória. Esse magnífico clímax da História é a última esperança do cristão. Diz o apóstolo Paulo: “Aguardamos a bendita esperança: a gloriosa manifestação de nosso grande Deus e Salvador, Jesus Cristo. Ele Se entregou por nós a fim de nos remir de toda a maldade e purificar para Si mesmo um povo particularmente Seu, dedicado à prática de boas obras” (Tito 2:13, 14).

Na ocasião, ocorrerão dois dos acontecimentos mais esperados pelos cristãos de todas as eras: a ressurreição dos santos mortos e a transformação dos santos vivos. Como é bom ser cristão adventista e crer na volta de Jesus. O quadro pintado por Paulo será a concretização de todos os que creram e que creem em Jesus e que, vivos ou mortos, aguardam ansiosos por Sua segunda vinda à Terra. Para eles, a morte não é o fim de todas as coisas; é simplesmente um sono de espera pela ressurreição e a vida eterna.

Esse evento é o grande clímax da história! É o cumprimento de toda espera e esperança do povo de Deus desde Adão até a última geração que estará vivendo na Terra. Por isso, o nosso foco permanente está no retorno de Jesus, Aquele que suportou a cruz “para tirar os pecados de muitos”, e que aparecerá pela segunda vez “para aqueles que esperam ansiosamente por Ele” (Hebreus 9:28).

Sim, haverá uma feliz reunião.

Aqueles que "dormiram no Senhor", não pereceram... Esta separação que nos causa tanta dor não será eterna. Eles também contemplarão o Senhor retornando em glória. Nós, os vivos "não precederemos os que dormem" v.15. Ou como diz a Nova Tradução na Linguagem de Hoje: “não iremos antes daqueles que já morreram”. Tanto nós quanto eles "seremos arrebatados" nas nuvens (v. 17).

Portanto, o apóstolo Paulo “assegura aos leitores que os cristãos vivos não se unirão ao Senhor antes daqueles que dormiram. [...] Assim, os santos vivos não terão prioridade sobre os que morreram no Senhor. Este ensino deixa claro o verdadeiro estado daqueles que morreram “em Cristo”. Eles estão adormecidos, aguardando a vinda do Senhor. Ainda não foram unidos ao Senhor, mas, como os cristãos vivos, aguardam o segundo advento para a tão esperada união com o Mestre (Jo 11:23-25). Nenhuma classe tem precedência sobre a outra; ambas serão levadas juntas em glória ao Senhor na Sua vinda” (Comentário Bíblico Adventista, v. 7, p. 249).

Nesse momento a história humana dará um salto para alcançar a eternidade, cuja porta estará aberta quando Jesus, o Criador e Redentor estenderá a mão para dar as boas-vindas aos fiéis, com as mais doces palavras jamais ouvidas: “Venham, […]. Recebam como herança o Reino que lhes foi preparado” (Mateus 25:34). É a herança final que estamos aguardando com esperança!

Existe uma forte razão para esta maravilhosa esperança de uma reunião além da sepultura.

Esta esperança está baseada sobre um sólido e indestrutível fundamento... Sim, ela se baseia na realidade de um Cristo vivo (v.14). A ressurreição do Senhor é o fundamento de nossa esperança. O apóstolo Pedro escreveu: Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo! Conforme a sua grande misericórdia, ele nos regenerou para uma esperança viva, por meio da ressurreição de Jesus Cristo dentre os mortos, para uma herança que jamais poderá perecer, macular-se ou perder o seu valor. Herança guardada nos céus para vocês que, mediante a fé, são protegidos pelo poder de Deus até chegar a salvação prestes a ser revelada no último tempo” (1 Pd 1:3-5, NVI).

Assim como Deus, o Pai, trouxe Jesus, nosso Salvador, dentre os mortos na manhã de Sua ressurreição no jardim, fora dos muros de Jerusalém, assim com Ele também trará nossos queridos mortos à vida novamente, quando voltar a segunda vez. Ela também está fundamentada no prometido e esperado retorno do Senhor à Terra (I Tes. 1:10; Atos. 1:10, 11).

Nosso coração então pergunta: "quando esta esperança será concretizada?"

Ela se concretizará quando o Senhor Jesus descer do Céu "com poder e grande glória". (I Ts 4:16; Mt. 24:30, 31). Sim, aqueles que "dormem no Senhor" ressurgirão (v.16). Quando esta maravilhosa reunião acontecer, os que "morreram em Cristo", ressuscitarão com um corpo incorruptível, imortal e glorioso, conforme lemos em I Cor. 15:42-44. Paulo também diz que os que estiverem vivos, serão transformados. “Eis que eu lhes digo um mistério: nem todos dormiremos, mas todos seremos transformados, num momento, num abrir e fechar de olhos, ao som da última trombeta. Pois a trombeta soará, os mortos ressuscitarão incorruptíveis e nós seremos transformados. Pois é necessário que aquilo que é corruptível se revista de incorruptibilidade, e aquilo que é mortal, se revista de imortalidade. Quando, porém, o que é corruptível se revestir de incorruptibilidade, e o que é mortal, de imortalidade, então se cumprirá a palavra que está escrita: "A morte foi destruída pela vitória". "Onde está, ó morte, a sua vitória? Onde está, ó morte, o seu aguilhão?” O aguilhão da morte é o pecado, e a força do pecado é a lei. Mas graças a Deus, que nos dá a vitória por meio de nosso Senhor Jesus Cristo” (I Co 15:51-57, NVI).

Como, gradualmente? Não. “Num momento. Num abrir e fechar dos olhos” (1 Co 15:51, 52). Então esta reunião final, feliz e eterna acontecerá. Os salvos estarão reunidos para nunca mais se separarem. Imagine a alegria que inundará o coração dos salvos ao poderem abraçar os queridos ressuscitados, que morreram crendo em Jesus. Não mais terão o rosto macilento e triste, marcado pela doença e a morte. Terão na face a alegria e a felicidade de uma nova vida ressurgida para a eternidade. Será maravilhoso aquela reunião quando, na presença de Cristo, junto ao belo portal da Cidade, uma mãe receber a recompensa de seus labores, tendo todos os seus filhos lá dentro.  Inegavelmente, será um momento muito glorioso. Será a vitória final de Jesus sobre as tristezas, dores, doenças, e a morte! Essa certeza nos conforta e nos anima na jornada, enquanto aguardamos o grande dia da volta de Jesus.

Que maravilhosa consolação esta esperança nos traz! Aguardo com muita expectativa o dia da volta de Jesus à Terra nas nuvens do Céu com poder e grande glória (Mt 24:30; Ap 1:7). Quando Ele ressuscitar os Seus filhos fiéis, quando o mesmo Senhor que disse à filha de Jairo “Talita cumi!  Menina, eu lhe ordeno, levante-se! "vai dizer à minha mãe: “Noêmia cumi! Eu te ordeno levanta-te”. Quão bom é sabermos que "a morte não é o ponto final, mas uma vírgula na história da vida", como alguém afirmou. Temos a esperança bíblica de um dia rever todos os nossos que já dormem no Senhor.

Essa minha reflexão bíblica é uma homenagem a Noêmia Cordeiro, minha mãe, amigos, familiares e a todos os que, descansando em paz, aguardam o retorno do Senhor. Em breve, as famílias do povo de Deus estarão reunidas outra vez, e para sempre! Por isso o apóstolo ordena: "Consolai-vos... uns aos outros com estas palavras" (v.18). Sim, o despojado pode ser consolado. Aquele que crê em Jesus não deveria, como fazem os pagãos, encher-se de angustiosa e desesperada tristeza na presença da morte.

Caro amigo leitor, você crê que Jesus morreu e ressuscitou dos mortos? Você crê que Ele vive para sempre? Você crê naquilo que Ele disse: "Porque Eu vivo, vocês também viverão?" (João 14:19, BLH). Permita que esta crença abrande sua tristeza. Você anseia pelo retorno do Senhor?  Se assim for, você não deveria preocupar-se por causa da condição presente e nem pelo estado futuro dos santos que "dormiram". Como a morte e a ressurreição do Senhor são a garantia e o penhor da ressurreição e glorificação de todos aqueles que "nEle dormem", você deveria regozijar-se na esperança de reunir-se com eles na cidade de Deus. Esta gloriosa e feliz reunião jamais terá fim. Um dia Jesus chamará Seus filhos fieis de todos os tempos, você e a mim, a cada um de nós, para uma vida que jamais acaba. Amém!

 

domingo, 3 de março de 2024

“VOLTANDO PARA CASA”: BOAS NOTÍCIAS DO SEGUNDO ANJO


 Ricardo André

"E seguiu outro anjo, dizendo: Babilônia caiu, caiu aquela grande cidade, porque ela fez todas as nações beberem do vinho da ira de sua fornicação" (Ap 14:8, BKJ 1611)

I – INTRODUÇÃO

Quando Deus criou nossos primeiros pais, Adão e Eva, colocou-os no jardim do Éden, cercado por árvores e animais (Gn 2:7, 8 e 15). Ele mesmo preparou com perfeição o Éden para ser o lar do primeiro casal humano, provido de tudo quanto o homem podia desejar e precisar. É difícil imaginar como deve ter sido o Éden e que paraíso deve ter sido. Após a queda no pecado, eles foram expulsos de seu lar edênico. Segundo Ellen G. White, Adão e Eva “com humildade e indizível tristeza despediram-se de seu belo lar, e saíram para habitar na Terra, onde repousava a maldição do pecado” (Patriarcas e Profetas, p. 61).

Esse foi o primeiro despejo da história da humanidade. A crise foi tão grave que foi necessário que Deus colocasse anjos à porta do jardim (Gn 3:23, 24). Adão e Eva viam sua casa, mas não podiam mais ter acesso a ela. Mas, Deus privou do Éden nossos primeiros pais com tristeza. “Quando a onda de iniquidade se propagou pelo mundo, e a impiedade dos homens determinou sua destruição por meio de um dilúvio de água, a mão que plantara o Éden o retirou da Terra. Mas, na restauração final de todas as coisas, quando houver "um novo céu e uma nova Terra", será restabelecido, mais gloriosamente adornado do que no princípio” (Idem, p. 62).

Jesus nos prometeu que teremos o Éden de volta. Ele retornou para o Céu e, desde então, está preparando novamente um lugar para Seus filhos (Jo 14:1-3). A fim de que as pessoas que viveriam nos “últimos dias” se preparassem para regressar ao Éden restaurado, Deus enviou-nos as mensagens dos três anjos, descritas em Apocalipse 14:6-12. Elas são os últimos apelos de Deus a um mundo ferido, aflito e ameaçado de desintegração para renunciar todo o tipo de idolatria e falsidade, e adorarem o Criador, e aceitarem o seu evangelho eterno. É a última mensagem, a última oferta de salvação para este mundo em dificuldade. Elas nos dão segura orientação numa época de relativismo, dúvida, evangelhos falsificados e milagres enganosos. Esses anjos falam para ajudar-nos a discernir o erro e apreciar a verdade como é em Jesus. Em sua essência, são o evangelho, puro e simples apresentado no contexto da “verdade presente” (2 Pe 1:12, ARC)

Historicamente, os Adventistas do Sétimo Dia têm visto seu surgimento e mensagem como enraizados no chamado urgente dos três anjos de Apocalipse 14:6-12, mais familiarmente conhecidos como as três mensagens angélicas. Elas formam o ponto central da identidade Adventista do Sétimo Dia. Cremos que, como parte do povo de Deus fomos comissionados para levar essa mensagem ao mundo inteiro em preparação para o segundo advento de Cristo, o que nos torna um povo singular e vital. No mesmo capítulo o povo de Deus é descrito como aqueles que guardam “os mandamentos de Deus e tem a fé de Jesus” (v. 12) e, no capítulo 12 no verso 17 aparecem como o remanescente que guarda “os mandamentos de Deus e tem o testemunho de Jesus”.

O conhecimento dessa mensagem, nos dias de hoje, faz com que entendamos porque somos Adventistas do Sétimo Dia. Um povo que tem uma mensagem profética a ser levada a todo mundo, que acredita de forma única na existência do juízo investigativo, no qual acredita na intercessão contínua de Cristo por cada um de nós, sendo um povo que guarda os mandamentos de Deus, inclusive o sábado, e que tem a fé em Jesus, que é “a fé na capacidade de Cristo de nos salvar ampla, completa e totalmente.” (Ellen G. White, Mensagens Escolhidas [CPB, 1987], v. 3, p. 172).

Tendo em vista a importância das três mensagens angélicas, existem fatores que tornam essa mensagem relevante para se ter uma identidade adventista. Em meio a um tempo de ampla apostasia, temos um povo que guarda os mandamentos de Deus e a fé de Jesus. Esse povo anuncia a chegada da hora do juízo, proclama a salvação por meio de Cristo e prediz a aproximação de Seu segundo advento. E essa obra coincide com a obra de julgamento no céu, iniciada em 1844, após o término da profecia dos 2 300 dias/anos de Daniel 8:14, e resulta numa obra de arrependimento e reforma na terra.

Todos os três anjos têm uma mensagem restauradora e reformadora para preparar o povo de Deus para a volta de Jesus (Ap 14:14-20). Eles são a resposta de Deus às bestas de Apocalipse 13, é a “verdade presente” necessária e anunciada por aqueles que suportam estes eventos do fim dos tempos. Não é sem razão que Ellen G. White descreveu essas mensagens como “as mais solenes verdades já confiadas a mortais” e sua proclamação como “uma obra da mais solene importância” (Testemunhos Para a Igreja [CPB 2007], p. 19).

Cada uma das mensagens possui um período específico de tempo para seu cumprimento, mas se aplica a outros momentos. Elas tem um início definido, porém não um fim estabelecido. Possuem uma mensagem relevante para seu tempo, mas se conectam com os períodos anteriores e posterior. A terceira se integra às demais apresentando o juízo pré-advento e a segunda vinda de Jesus.

Ellen G. White mostrou nitidamente essa integração entre as três mensagens angélicas quando afirmou que “a primeira e a segunda mensagens foram dadas em 1843 e 1844, e estamos agora sob a proclamação da terceira; mas todas as três mensagens devem ainda se proclamadas” (As Três Mensagens Angélicas [CPB, 2023], p. 27).

Para isso, Deus Yahweh chamou um povo com uma missão de anunciar essas mensagens ao mundo. Ele não deu uma mensagem simples nem fácil, mas forte e desafiadora. O conteúdo dela é premente, opõe-se ás crenças populares e mexe com poderes religiosos dominantes. Para anuncia-las, Deus precisa de um povo profundo estudioso das Sagradas Escrituras, equilibrado, obediente e comprometido com a missão.

Ellen White afirma que “Deus está chamando Sua igreja hoje, como chamara o antigo Israel, a fim de erguer-se como luz na Terra. Pela poderosa espada da verdade, as mensagens do primeiro, segundo e terceiro anjos, separou-os das igrejas e do mundo para trazê-los a uma santa proximidade Dele. Fê-los depositários de Sua lei, e confiou-lhes as grandes verdades da profecia para este tempo. Como as Santas Escrituras confiadas ao antigo Israel, estas são um sagrado depósito a ser comunicado ao mundo. Os três anjos de Apocalipse 14 representam o povo que aceita a luz das mensagens de Deus, e vão como agentes Seus fazer soar a advertência por toda a extensão e largura da Terra” (Ellen G. White, Testemunhos Para a Igreja, v. 5, p.455, 456). Contudo, este artigo não tem como objetivo analisar as três mensagens angélicas, mas focalizar apenas a segunda mensagem, pouco pregada em nossas igrejas.

Infelizmente, a mensagem do segundo anjo nem sempre tem sido pregada como uma mensagem relevante para nós da igreja, mas sim como uma mensagem que precisa ser proclamada a outros. A nossa prática ignora a nossa crença de que as mensagens dos três anjos deveriam ser uma plataforma central na preparação de todo o povo de Deus para os últimos dias. Como mensagem preparatória, como a mensagem do segundo anjo tem relevância para todo o povo de Deus?

II – O EVANGELHO ETERNO NO MUNDO

O profeta João vê três anjos voando pelo meio do céu proclamando o evangelho eterno no mundo inteiro. Quem são esses anjos de Apocalipse 14:6-12? Estes anjos evidentemente são simbólicos, pois lhes foi confiada a tarefa de pregar o evangelho eterno às multidões. Essa tarefa não foi confiada por Deus a anjos literais, mas a seres humanos. A palavra grega traduzida por “anjo” significa “mensageiro”, como as vezes é traduzida em outras passagens. Esses mensageiros podem ser humanos (Mt 11:10; Mc 1:2; Lc 7:24; 9:52; Tg 2:25). Portanto, “estes anjos representam aqueles que recebem a verdade e com poder abrem o evangelho diante do mundo” (Ellen G. White, A Verdade Sobre os Anjos [CPB, 2010], p. 247), numa ocasião em que “é chegada a hora do Seu juízo” (v. 7). O anjo representa os santos de Deus empenhados na tarefa de proclamar o evangelho eterno por ocasião do início do juízo pré-advento.

Também é verdade que anjos literais auxiliam os homens na tarefa de proclamar o evangelho, mas esta não é a ideia que predomina no texto. Diz a serva do Senhor:

“Em todas as partes do mundo, estão anjos de Deus abrindo portas até há poucos cerradas à mensagem da verdade. Da Índia, da África, da China e muitos outros lugares, ouve-se o grito: ‘Passa e ajuda-nos’” (Ellen G. White, Obreiros Evangélicos, p. 465).

“Enquanto alguns estão no vale da decisão, os anjos estão unindo os verdadeiros e fiéis servos de Cristo para ajudar essas necessitadas almas. (...) Instrumentalidades angelicais, embora invisíveis, estão cooperando com as visíveis instrumentalidades humanas, formando uma associação beneficente com os homens. Não existe alguma coisa estimulante e inspiradora neste pensamento de que o agente humano fica como instrumento visível para transmitir as bênçãos das instrumentalidades angelicais? (...) As instrumentalidades humanas são as mãos dos instrumentos celestes, pois os anjos se utilizam das mãos dos homens no ministério profético. (...) Esta é a maneira pela qual o Céu ministra o poder vivificante” (Ellen G. White, Minha Consagração Hoje [MM 1989], p. 304, 305).

Simbolizando uma mensagem ou um mensageiro, estes anjos representas um movimento de âmbito mundial; não alguma mensagem nova, mas a mesma mensagem do passado. “O voo do anjos ‘pelo meio do céu’, ‘dizendo com voz forte’ a advertência e sua proclamação a todos os ‘que habitam na Terra, e a cada nação, tribo, língua e povo’, evidenciam a rapidez e extensão mundial do movimento” (Ellen G. White, As Três Mensagens Angélicas, p. 35).

Deus sempre teve apenas um único evangelho. O evangelho eterno nunca muda. Ele foi anunciado primeiro no Éden (Gn 3:15), depois para os filhos de Israel (Hb 4:1-2), e é proclamado de novo a cada geração.

O QUE SIGNIFICA A “BABILÔNIA”?

O anjo anuncia a João que “'Caiu, caiu Babilônia'” (Ap 14:8). É nesse texto que pela primeira vez “Babilônia” é introduzida no livro de Apocalipse. Mas é apenas nos últimos capítulos de Apocalipse que aprendemos sobre a identidade abrangente de Babilônia. No primeiro uso da palavra, João pretende recordar o contexto do tempo de Daniel, quando Babilónia governava o mundo e a falsa religião de Babilônia dominava o povo de Deus.

A Babilônia dos dias de Daniel oferece falsa adoração, deifica o rei e espera a adoração de uma imagem de “vinte sete metros de altura e dois metros e setenta centímetros de largura” (Dan. 3:1, NVI). A filosofia da Babilônia é “dobrar ou queimar”: deixar de adorar como a Babilônia exige é punível com a morte. Babilônia é o epítome de tudo o que o pecado representa. É o centro de toda idolatria. No Antigo Testamento, os ídolos eram comuns na adoração babilônica (Jr 50:33-38; 51:17, 47). O governo de Satanás pode ser visto.  O Comentário Bíblico Adventista do Sétimo Dia nos lembra que “o profeta Isaías identifica Lúcifer como o rei invisível de Babilônia” (v. 7, p. 917). O pecado cresceu tanto ao ponto de Satanás matar todos aqueles que se opõem à sua vontade e ao seu direito de governar.

No tempo do fim, o dragão criará uma Babilônia mística por intermédio da qual tentará ocupar o lugar de Deus e receber a adoração que Lhe é devida. No Apocalipse o termo Babilônia é empregado “para designar as várias formas de religião falsa” (Ellen G. White, As Três Mensagens Angélicas, p. 47 e 48). Babilônia “indica todas as organizações apóstatas e sua liderança desde a Antiguidade até o fim dos tempo” (Comentário Bíblico Adventista do Sétimo Dia, p. 919). “Em Apocalipse capítulo 17, Babilônia é representada por uma mulher - figura que a Bíblia usa como símbolo de igreja, sendo uma mulher virtuosa a igreja pura, e uma mulher desprezível, a igreja apóstata” (Ellen G. White, O Grande Conflito [CPB, 2006], p. 381). Apocalipse 17 descreve um sistema religioso apóstata, que inclui o catolicismo romano e suas “filhas”, o protestantismo apóstata (v. 5). Babilônia é constituída por uma falsa trindade: a besta do mar (Ap 13:1), o cristianismo apostatado da Idade Média; a besta da terra (v. 11), o protestantismo apostatado, representado pelos Estados Unidos; e o dragão, a obra de Satanás por meio do espiritualismo (Ap 16:13, 14). Portanto, na segunda mensagem do segundo anjo, a antiga cidade de Babilônia é considerada um tipo ou símbolo do tempo do fim. Representa um falso sistema religioso com características semelhantes à Babilônia do Antigo Testamento. Os princípios que guiavam a antiga Babilônia são a estrutura subjacente da Babilônia moderna e mística. De acordo com a Revelação, ela seduz as nações com o "vinho da fúria da sua prostituição". Esse “cálice intoxicante de veneno que ela oferece ao mundo representa as falsas doutrinas que aceitou como resultado de suas relações ilícitas com os grandes da Terra” (Ellen G. White, As Três Mensagens Angélicas [CPB, 2023], p. 49). Babilônia espiritual “mudou o dia de repouso, colocando o primeiro dia da semana onde deveria estar o sétimo” (Ellen G. White, Eventos Finais [CPB, 2011], p. 74).

Todavia, a Babilônia inclui mais do que a adoração falsa e uma união ilícita entre a Igreja e o Estado. Também possui um falso caminho de salvação. Enquanto as Sagradas Escrituras ensinam a salvação pela fé no sacrifício de Jesus Cristo (Atos 4:12; Apocalipse 13:8), Babilônia promove hereticamente salvação por sacramentos, indulgências, ensinando que, pelas obras das próprias mãos, a pessoa alcança o favor de Deus e a salvação. Os deuses babilônicos salvam através de uma mistura de esforço humano e expiação. Enquanto Cristo intercede por seu povo no santuário celestial, ela estabeleceu um sistema terrestre rival por meio da missa e da intercessão sacerdotal e dos santos. Babilônia, portanto, falsificou toda a mensagem do primeiro anjo. Tanto o seu evangelho como a sua lei são falsificações. Esta “é uma mensagem que continuará evidentemente até o fim, uma vez que Babilônia é descrita como se tornando cada vez pior” (Tratado de Teologia Adventista do Sétimo Dia [CPB, 2011], p. 965, 966).

EXPLORANDO AS MÚLTIPLAS QUEDAS DA BABILÔNIA

O anjo anuncia a João a queda da Babilônia (Ap 14:8). O anúncio encoraja todos os santos. A certeza da queda de Babilônia é definitivamente uma boa notícia para eles. O povo de Deus há muito espera pela queda do seu inimigo, simbolizado na Babilônia. Quando o inimigo cai, o povo de Deus fica livre. No tempo de Daniel, o povo esperava a libertação após os 70 anos de cativeiro, esperando que a queda da Babilônia os levasse a regressar a casa. Portanto, a queda da Babilônia foi um momento de grande alegria.

“Nos dias do profeta Daniel, o rio Eufrates literal atravessava a cidade real de Babilônia. As suas águas abundantes constituíam parte importante do sistema defensivo da antiga Babilônia. Na noite em que os exércitos de Ciro, comandados por Dario, o medo, atacaram a cidade em 539 a. C., o nível das águas do rio achava-se muito abaixo do normal. O ataque ocorreu numa estação em que as águas costumeiramente eram mais baixas, e alguns historiadores antigos afirmam que as tropas invasoras escavaram um canal lateral ao rio, a fim de reduzir ainda mais as água deste” (C. Mervyn Maxwell, Uma Nova era Segundo as Profeciais do Apocalipse, p. 456, 457). O “secamento” das águas do Eufrates abriu o caminho para Ciro, o persa, e Dario, o medo, os reis “do nascente do Sol” (leste), entrarem em Babilônia e a conquistarem, em 539 a. C. (Is 41:2, 25).

“Uma das primeiras providências do rei Ciro após a tomada de Babilônia, foi decretar a libertação dos cativos judeus de seu exílio, e permitir-lhes que retornassem a seu lar na Judeia. Em virtude da generosidade de Ciro, o profeta Isaías falou dele como se Ele fosse o próprio Jesus Cristo. Isaías retrata a Deus referindo-se a Ciro como o “Meu Pastor” e como o Seu “ungido”, a pessoa que Ele escolheu para “subjugar as nações”. No mesmo contexto, Isaías também apresenta a Deus dizendo: “Eu secarei os teus rios” (Is 44:27-45; Jr 51:36)” (Idem). Algo similar há de acontecer à moderna Babilônia, o sistema mundial da religião falsa.

A descrição do colapso da Babilônia do fim dos tempos em Apocalipse é baseada na queda da antiga Babilônia. Assim como a queda da antiga Babilônia era uma certeza ordenada por Deus (Is 21:9) para os israelitas dos dias de Daniel, também a queda da Babilônia do fim dos tempos será uma certeza para o povo de Deus no fim dos tempos.

O atual povo de Deus precisa ouvir que a queda de Babilônia significa que eles também podem voltar para casa. Nosso lar celestial nos espera. Os “reis do oriente” (Apocalipse 16:12) que causaram a queda de Babilônia durante a sexta praga possibilitaram que voltássemos para casa. O rei Ciro veio do leste para derrotar a Babilônia. Assim, nosso Rei Jesus, nosso Cristo e nosso Ciro, vem do Oriente para nos libertar. A queda final da Babilônia significa que estamos totalmente livres e podemos voltar para casa.

Muitas vezes olhamos para a queda de Babilônia como algo simplesmente moral. É claro que o povo de Deus em Babilônia é chamado para não ser moralmente corrompido pelos seus pecados (Ap 18:4). Contudo, esses pecados levaram à queda e destruição de Babilônia. Em Apocalipse 18, vemos o destino da Babilônia: “ela será consumida pelo fogo” (v. 8), “chegou a tua condenação” (v. 10), “foi arruinada” (v. 19), e “derrubados, para nunca mais serem encontrados” (v. 21, NVI). Nosso Rei conquistador faz mais do que acabar com as monstruosas depravações da Babilônia ou aplicar justiça – nosso Rei vem para libertar Seu povo. Nosso Rei vem para derrotar Babilônia para que possa nos levar para casa “juntos” (1 Tessalonicenses 4:17). O Apocalipse revela que no tempo do fim, o povo de Deus será afligido e perseguido por um opressor religioso chamado “Babilônia, a Grande” (Ap 17:5), e que, em um momento de caos social, crise política, desastres naturais e colapso econômico, Deus envia seu Ciro do tempo do fim, que é Jesus, para secar o Eufrates do tempo do fim para libertar o Israel do tempo do fim da Babilônia do tempo do fim, para que eles possam viver em uma nova Jerusalém. Jesus reinará eternamente e estabelecerá firmemente Seu trono no Universo para sempre (Dn 2:44).

A mensagem da queda de Babilônia contém notícias maravilhosas também para aqueles que estão prisioneiros na Babilônia. Diante da ampliação de sua queda, Deus faz um chamado direto ao seu povo que ainda está em Babilônia: “Sai dela, povo meu, para que não sejais participantes de seus pecados, e para que não recebam suas pragas” (Ap 18:4, BKJ 1611).

Sobre isso, Ellen G. White escreveu: “Apesar das trevas espirituais e do afastamento de Deus prevalecentes nas igrejas que constituem Babilônia, a grande massa dos verdadeiros seguidores de Cristo ainda faz parte delas. Há muitos deles que nunca souberam das verdades especiais para este tempo” (As Três Mensagens Angélicas [CPB, 2023], p. 104). Por conta disso, ela aconselha a respeito da maneira adequada de pregar o evangelho para essas pessoas: “Deus tem pedras preciosas em todas as igrejas e não cabe a nós fazer uma denúncia abrangente do mundo professamente religioso, mas, com humildade e amor, apresentar a verdade toda, como ela é em Jesus” (Idem, [CPB, 2023], p. 105). Deus ama os Seus filhos e filhas que ainda estão dentro de Babilônia. Por isso, não devemos usar a segunda mensagem angélica para acusar ou combater, mas para amar, testemunhar e buscar aqueles que o Senhor está preparando para se unir a Seu povo.

Portanto, o chamado de Deus para Seu povo sair de Babilônia é uma mensagem de misericórdia. Esta mensagem revela claramente que a porta da misericórdia ainda está aberta – que a localização de uma pessoa não determina o seu destino. O amor de Jesus nos corações daqueles que são chamados de “meu povo” (Ap 18.4) na Babilônia é mais importante para Deus do que seus distintivos e rótulos. Com que urgência o coração de Deus roga que Seu amor alcance até mesmo aqueles que estão na Babilônia para ajudá-los a perceber que não estão onde Ele deseja que estejam? Quão importante é para o povo de Deus soar como Deus ao aprender a pronunciar essas palavras com compaixão.

Portanto, o chamado para que saiam da Babilônia é um chamado de incrível misericórdia e graça. Eles são chamados a ir para um lugar melhor e servir a um evangelho melhor do que um evangelho limitado pela crença em um inferno sempre ardente. Eles também podem ir para casa porque a queda de Babilônia não precisa os incluir. Eles podem ficar livres das experiências enganosas e das falsas promessas da Babilônia. Esta mensagem de liberdade e libertação para aqueles que ouvem e respondem dá continuidade às maravilhosas boas novas do primeiro anjo.

Muitas vezes as pessoas que estão presas à confusão ouvem que a cruz é tão pequena que Deus só pode colocar o pecado, os pecadores e Satanás no inferno. Este inferno, eles aprendem, continua eternamente. Quão maravilhosa é a boa notícia de que Jesus é mais poderoso do que eles jamais imaginaram. Jesus veio para lidar com o pecado de forma completa e definitiva. Agora podem acreditar na promessa feita a Adão de que a cabeça de Satanás será esmagada (Gn 3.15). Este é o plano soberano de Deus. A mensagem que temos de partilhar com Babilônia sobre o evangelho eterno é um conceito mais amplo do amor de Deus e do que Jesus fez através da Sua vida e morte. Este evangelho maior ensina que o pecado tem um fim e que a vitória de Jesus sobre o pecado é final e conclusiva.

A queda da Babilônia do fim dos tempos está diretamente ligada às pragas em Apocalipse 16:12–16. A queda física da antiga Babilônia ecoa através do ressecamento do Eufrates, assegurando assim ainda mais ao povo de Deus do fim dos tempos que a Babilônia do fim dos tempos terá o mesmo destino que a sua antecessora. Somente Jesus derrota Babilônia (v. 15,16), e Sua guerra é em nome dos santos. A queda da Babilônia é o Armagedom. Como afirma Hans LaRondelle: “O Armagedom e a destruição da Babilônia universal são, portanto, idênticos” (Carruagens da Salvação, p. 100).   Jesus vem buscar os proclamadores destas três mensagens e aqueles que deixaram Babilônia. Assim, a pregação da volta de Jesus é parte integrante da mensagem do segundo anjo. A volta de Jesus é uma mensagem cheia de esperança, antecipada pelos santos há milênios (Ap 22.20). Esta mensagem significa que todos podemos voltar para casa e estar com Jesus para sempre.

A queda da Babilônia espiritual vem acontecendo de forma progressiva, ao longo dos tempos. Ela está confusa, mas ainda não caiu por completo. Sua queda completa ocorrerá ainda no futuro. A mensagem do segundo anjo é em grande parte uma mensagem futura. Ainda estamos esperando que “todas as nações” sejam enganadas. Sobre isso, Ellen G. White escreveu: “A Escritura Sagrada declara que Satanás, antes da vinda do Senhor, operará "com todo o poder, e sinais e prodígios de mentira, e com todo o engano da injustiça"; e "os que não receberam o amor da verdade para se salvarem" serão deixados à mercê da "operação do erro, para que creiam a mentira". II Ts. 2:9-11. A queda de Babilônia se completará quando esta condição for atingida, e a união da igreja com o mundo se tenha consumado em toda a cristandade. A mudança é gradual, e o cumprimento perfeito de Apocalipse 14:8 está ainda no futuro” (O Grande Conflito, p. 389, 390).

O longo processo desta queda moral culmina, como no caso da Babilônia literal (Dn. 5:26-28), numa completa destruição escatológica da Babilônia espiritual. Para esta libertação final devemos esperar até que a culpa de Babilônia seja completa e a misericórdia de Deus se esgote (Ap 18:5-8). O fim dos sistemas que matariam o povo de Deus é saudado por um retumbante grito de aleluia (Ap 19:1). O reinado do pecado na terra acabou para os santos. Eles estão voltando para casa. Não admira que a celebração supere qualquer celebração anterior no planeta Terra. Estas reflexões adicionais não contradizem o que sempre ensinamos sobre a queda moral de Babilônia, mas antes expandem-nas e mostram que Apocalipse 14:8 é mais do que uma queda moral. A queda da Babilônia é uma mensagem de que Jesus voltará em breve. Como tal, esta mensagem prepara o povo de Deus para aquele “grande e terrível dia do Senhor” (Malaquias 4:5). É a esperança que purifica (1Jo 3:3), e é a volta de Jesus que nos lembra quais pessoas devemos ser (2Pe 3:11). As boas novas da volta de Jesus são uma mensagem preparatória para todas as pessoas.

Podemos confiar na promessa de Jesus: “E quando eu for e vos preparar um lugar, eu voltarei novamente, e vos receberei para mim mesmo, para que, onde eu estou, ali possais estar vós também” (Jo 14:3, BKJ 1611). Em breve, iremos para casa. O Senhor Jesus estará para sempre conosco. Não seremos mais expulsos; não lutaremos por uma casa ou emprego; não haverá mais morte, lágrimas, luto ou dor (Ap 21:4); não vamos mais enterrar nossos queridos; nunca mais veremos tragédias naturais; não haverá mais corrupção, violência, medo, sequestro ou roubo. Nunca mais! A Nova Terra é o nosso verdadeiro lugar de descanso.

Falando sobre a nova Terra, Ellen G. White escreveu: “Existem torrentes sempre a fluir, claras como cristal, e ao lado delas, árvores ondeantes projetam sua sombra sobre as veredas preparadas para os resgatados do Senhor. Ali as extensas planícies avultam em colinas de beleza, e as montanhas de Deus erguem seus altivos píncaros. Nessas pacíficas planícies, ao lado daquelas correntes vivas, o povo de Deus, durante tanto tempo peregrino e errante, encontrará um lar” (O Grande Conflito, p. 675).

CONCLUSÃO

O segundo anjo fala de um sistema que tem tentado ativamente esconder o evangelho e tudo o que Jesus fez por nós. O segundo anjo anuncia que as obras e a salvação de Babilônia caíram enquanto o povo de Deus está destinado a voltar para casa. Cada uma dessas três mensagens de Apocalipse 14 é de fato uma mensagem de amor que vem do coração de Deus não apenas para alertar os ímpios, mas para preparar o povo de Deus para o que está por vir. Como mensagens de misericórdia, são boas notícias. Se conseguirmos reformular o nosso foco, poderemos ver o verdadeiro coração de Deus e os Seus propósitos em fazer com que estas mensagens sejam entregues a todos. Eles são oportunos, verdadeiros e ainda são nossa mensagem e mandato. Como mensagens preparatórias para o povo de Deus, elas nos ajudam a ver as coisas da perspectiva de Deus. Eles podem ser resumidos de forma bastante sucinta: Deus odeia o pecado e Jesus vence para que possamos voltar para casa juntos.

Caro amigo leitor, a última mensagem de salvação deve ir a todo o mundo com extraordinário poder e graça. Unamo-nos a Deus e a Seus servos na grande obra da pregação do evangelho. Coloque o seu melhor a serviço da causa do Senhor, pois em breve Jesus voltará. “O fim de todas as coisas está às portas, e o que tiver que ser feito pela salvação de pessoas deve ser feito rapidamente” (Ellen G. White, Perto do Céu [MD 2013], p. 69).